segunda-feira, novembro 10

Eu, passarinho.

Poeminha do Contra (Quintana)

Todos esses que aí estão
atravancando meu caminho,
eles passarão...
eu passarinho!


Soneto de Fidelidade

De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

Vinícius de Morais

A Partida (Vinícius)

Quero ir-me embora pra estrela

Que vi luzindo no céu

Na várzea do setestrelo.

Sairei de casa à tarde

Na hora crepuscular

Em minha rua deserta

Nem uma janela aberta

Ninguém para me espiar

De vivo verei apenas

Duas mulheres serenas

Me acenando devagar.

Será meu corpo sozinho

Que há de me acompanhar

Que a alma estará vagando

Entre os amigos, num bar.

Ninguém ficará chorando

Que mãe já não terei mais

E a mulher que outrora tinha

Mais que ser minha mulher

É mãe de uma filha minha.

Irei embora sozinho

Sem angústia nem pesar

Antes contente da vida

Que não pedi, tão sofrida

Mas não perdi por ganhar.

Verei a cidade morta

Ir ficando para trás

E em frente se abrirem campos

Em flores e pirilampos

Como a miragem de tantos

Que tremeluzem no alto.

Num ponto qualquer da treva

Um vento me envolverá

Sentirei a voz molhada

Da noite que vem do mar

Chegar-me-ão falas tristes

Como a querer me entristar

Mas não serei mais lembrança

Nada me surpreenderá:

Passarei lúcido e frio

Compreensivo e singular

Como um cadáver num rio

E quando, de algum lugar

Chegar-me o apelo vazio

De uma mulher a chorar

Só então me voltarei

Mas nem adeus lhe darei

No oco raio estelar

Libertado subirei.


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